sábado, 7 de dezembro de 2019

Entrevista com Artur de Vargas Giorgi


Artur de Vargas Giorgi é paulistano; reside em Desterro (Ilha de Santa Catarina) desde 2002. É professor de Teoria Literária na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Nas artes visuais, desenvolve um trabalho nada sistemático entre o desenho, a colagem, a fotografia e a pintura, sempre em contato tenso com a palavra. No blog contemplação metódica da mosca - espécie de laboratório ou de arquivo anárquico - esse trabalho emula um dia-a-dia, num curto período, mas com efeito se estende, intermitentemente, de 2010 ao presente. Publicou com Ana Chiara o livro enxerto para uma vida feliz (Rio de Janeiro, Casa 12, 2012). Algumas de suas ilustrações estão em capas de livros e, em 2018, participou da exposição coletiva Múltiplos (Museu Victor Meirelles, Florianópolis), com trabalho feito em parceria com Cristiane Lindner.




Artur volta à parceria com Ana Chiara no livro Poema da travessia, que a Editora TextoTerritório lançará na próxima quarta, dia 11/12.


Leia aqui uma entrevista da TextoTerritório com o artista e veja alguns de seus trabalhos, escolhidos pelos editores dentre diversos que estão no blog contemplação metódica da mosca.



TT: Como você pensa a relação entre imagem e palavra?

Artur de Vargas Giorgi: Diria que a relação é estética, no sentido mais fundamental do termo: palavra e imagem são modos – distintos, mas afins – da vida sensível. Com elas e entre elas, os afetos, as emoções, os pensamentos, enfim, os sentidos (intelectuais, corpóreos) transitam no espaço e no tempo, de maneira muitas vezes imprevista. Esse trânsito é, talvez, a força por elas compartilhada: cada palavra, cada imagem modula uma saída, uma abertura no mundo. Não à toa, sujeitos e comunidades se constituem, antes de tudo, com o que falam, escutam, veem, tocam, sentem, e com o que podem ou não fazer com o que falam, escutam, veem, tocam e sentem. Palavras e imagens são estruturantes da vida individual e coletiva.



TT: Como, para você, imagem e palavra interagem com as diversas instâncias da realidade, da vida?

AVG: Me parece que o que afirmei acima já aponta a importância política e o fundo ético da estética. Entendo que arte é saber fazer: nem bem nem mal, mas saber fazer o que afinal se faz, sabendo que essa feitura não se encerra no feito, por mais perfeito que este seja. Artes são os muitos modos de fazer, de produzir efeitos sensíveis no mundo; ou seja, as imagens e as palavras não se colocam diante de um mundo já dado de maneira parasitária, secundária; ao contrário, elas participam da complexa elaboração do mundo, às vezes construindo, outras vezes destruindo. Seja como for, se queremos mundos melhores ou diversos, mundos ainda possíveis, sem dúvida as imagens e as palavras participarão dessa feitura.



TT: Qual a relação da sua criação plástica com as novas tecnologias virtuais?

AVG: Sinceramente, não considero as novas tecnologias virtuais de maneira específica. Não pesquiso programas, ou recursos, ou ferramentas de interatividade etc. Não sou, mesmo, seduzido por gadgets; bem ao contrário, aliás, me considero um ser arcaico... Por outro lado, penso que a “virtualidade” sempre foi indissociável das artes; muito simplesmente, isso quer dizer que se algo pode vir a ser (o que significa que pode também vir a não ser) é porque há uma força virtual que trabalha junto com as formas mais concretas. Desde o início dos tempos, por assim dizer, fazemos links entre as estrelas para festejar, plantar, colher, navegar; desvendamos sentidos, passados e futuros em tripas de animais, na palma da mão, nas paredes de cavernas; projetamos os mais diversos sonhos como forma de plasmar e viver na realidade etc. etc.



TT: Como foi a experiência de compor as imagens para o livro Poema da travessia?

AVG: A parceria com Ana Chiara vem de anos, já. Desta vez, trabalhei a partir dos poemas já feitos e reunidos. De qualquer forma, é sempre um desafio... Porque as imagens não devem ilustrar, no sentido de esclarecer, explicar ou mesmo redizer o já dito no texto; devem ser, se possível, uma espécie de tradução, o que sempre implica reconhecimento e, ao mesmo tempo, traição, isto é, desvio, diferença, desconhecimento. Nada mais oportuno, portanto, para este livro: conduzir os poemas para outro lugar, um lugar estranho, é uma forma de ser fiel à travessia.


TT: Poderia citar os trabalhos anteriores que já fez com Ana?

Houve trabalhos acadêmicos, sobretudo. Capas de livros que ela organizou, um capítulo de livro...
Mas, recentemente, Ana escreveu uma apresentação para o dossiê "Nós dois, juntos", com trabalhos meus. Saiu no suplemento de artes da revista Landa.

Capa do livro Corpos diversos, com desenho de Artur de Vargas Giorgi

TT: No seu trabalho, quais são os lugares da construção afetiva do outro?

AVG: O lugar da construção afetiva do outro deveria ser um outro lugar que não o do senso comum. Não sei o que é isso, “o outro”. Não sei, diante disso, qual o seu lugar, e assim dificilmente consigo precisar qual o meu. Tento partir de um topos atópico, por assim dizer. Linguagem – qualquer que ela seja – poderia ser o nome desse lugar impróprio e inapropriável. Talvez por isso meu método de trabalho seja a ausência quase total de disciplina e sistematicidade. Diria que, diante do “outro”, só posso trabalhar como um amador: como um diletante, talvez; como alguém movido por afetos, sem dúvida.

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