domingo, 20 de setembro de 2020

Moacyr Félix, eu e nossas consciências Carlos Augusto Corrêa

Moacyr Félix, eu e nossas consciências

Carlos Augusto Corrêa 

Numa das mil vezes em que estive na casa de Moacyr Félix pra conversarmos sobre nossa paixão maior, a poesia, disse que queria mais uns dois, três livros importantes da poesia novíssima pra que pudesse me demorar escrevendo ensaios sobre eles em minha coluna de jornal, e não propriamente dar uma nota breve de três ou quatro deles, como muitas vezes fazia pois a quantidade de publicações razoáveis que chegavam era muita de fato, sobretudo quando eu estava pra completar um ano de coluna semanal.

Moacyr arregalou os olhos, e notei que havia surpresa, mais espanto, em seu olhar, por eu ter escolhido a ele para essa sugestão. Além do mais, o editor e poeta adorava influenciar a geração mais nova à qual eu também pertencia. Disse qualquer coisa como "é pra já", foi até um canto de sua biblioteca que ocupava boa parte de seu vasto apartamento e de repente me trouxe mais ou menos uns quarenta livros e afirmou: pode confiar, Carlos Augusto, esses poetas merecem um estímulo em qualquer coluna literária desse país. Aí repliquei: mas eu quero primeiro passar os olhos neles. E Moacyr: e precisa? Eu fui direto: claro, quero tão só dar uma olhadela. E dei: folheava aqui, ali e também acolá. Eram páginas de um, de seis, de todos, enfim.

Fiquei ansioso ao final, mas resolvi passar como um trator pela ansiedade. Afinal, meus vinte e tantos anos tinham a coerência, a minha, como arma, sem querer saber se estava tratando com A, B ou C da elite literária. Passei por cima do carinho que tinha pelo amigo, e não era pouco, e selecionei apenas dois livros. Pudesse, e Moacyr me jogaria lá do terceiro ou quarto andar onde morava. Ficou um tanto irritado, mas resolveu me acatar. Recolheu os demais livros e permitiu que eu levasse os dois vitoriosos.

Moacyr era assim, não só verboso como poeta senão também generoso com os amigos a quem queria ajudar pelo talento de cada um, principalmente quando a poesia deles era bem retórica como a sua. Fui pra casa naquele dia feliz por ter estado mais uma vez com ele e satisfeito ainda por ter acompanhado, como sempre, a minha consciência.

2 comentários:

Alexandre Faria disse...

Lembra quais foram os livros escolhidos, Carlos?

Unknown disse...

Eu me lembro de uma: o de Ana Cristina Cesar. Do outro não.

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