terça-feira, 20 de abril de 2021

Política e família, Alexandre Faria

No quarto texto da série "Liberdade sempre", Alexandre Faria nos oferece a lucidez dos que enxergam a tamanha desdita que se abate sobre a sociedade brasileira, às voltas com a pandemia e a ação genocida do Estado. Quando afirma que “não é fácil viver no Brasil hoje, sempre na iminência da própria morte e na certeza da morte alheia”, nos põe frente a frente com a perplexidade de viver sobre estes tempos de ódio.

Política e família

Em 6 de outubro de 2018, vésperas da eleição presidencial, na tentativa de demover alguns amigos e parentes de votar num genocida, montei algumas fotos do holocausto que ceifou a vida 6 milhões de judeus e postei essas imagens: 



É claro que os números não se equiparam ao que vemos hoje no Brasil, mas não consigo deixar de lembrar esse post. Não é fácil viver no Brasil hoje, sempre na iminência da própria morte e na certeza da morte alheia. Não a morte aleatória do acidente e da doença, mas a morte sistemática produzida pelo Estado. A necropolítica. Isso há muito não é novidade para os corpos negros e indígenas do Brasil. Para a minha geração de homem branco de formações europeia, é recorrente a referência à memória histórica de outras pestes associada à lembrança da guerra. Sim, sem as duas referências históricas não há como fechar um entendimento do que vivemos no Brasil. Bolsonaro não precisa de câmeras de gás porque já tem a pandemia. E nem de uma SS ou de um sistema de comunicação forte. Apenas aparece sistematicamente em sua própria rede social e em alguns canais que lhe dão visibilidade; nega e renega a possibilidade de governar a par dos mais óbvios e ululantes conhecimentos científicos: não há tratamento precoce e a única coisa que pode minimizar o avanço da contaminação é o distanciamento físico e o uso de equipamentos de proteção individual. Com a sua postura o presidente do Brasil vira objeto de chacota e repúdio mundial. Nega a vida e o faz, desde sua posição de líder, de forma que as pessoas se confundam, se exponham e adoeçam cada vez mais. E morram cada vez mais.

A conduta pública do presidente não é incoerente em relação às recomendações básicas dos profissionais de saúde. É voluntariamente contrária a todas as recomendações sãs e sanitárias, de caso pensado, pois seu projeto é o de um genocida.

Não tenho forças para dizer ou fazer nada. Não é fácil repetir o óbvio. Sinto um misto de raiva, medo e impotência. Assumo uma depressão, saio das redes, pois não enxergo nelas mais do que catarse da tragédia cotidiana. Silencio. E sinto uma saudade enorme do meu irmão, que se foi, com quem não poderei mais discutir sobre as complexas relações que obrigam a ficarem no mesmo grupo a família e a política.

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